Precisamos de adultos que resolvam problemas complexos, por isso, a Educação Básica precisa ensinar os estudantes a pensar
Lembro que, quando estava no antigo ginásio, aprendi a tomar notas de tudo que os professores falavam e decorar frases inteiras. Muitas vinham escritas no quadro-negro e bastava copiar na hora, ou depois, de alguma colega (sim, o colégio era só para meninas) mais disciplinada em manter o caderno em ordem.
Com isso, acabei memorizando, em muitas disciplinas, datas e fatos, fórmulas e trechos dos livros didáticos. Mas aprendi a pensar? Certamente que não.
Eram outros tempos e, para produzir trabalhos escolares, consultávamos enciclopédias. Delas, também, copiávamos, ou melhor, mudávamos as palavras para não parecer cópias literais.
Em matemática treinávamos rapidez mental ao decorarmos algoritmos (também copiados do quadro) e fazermos. Como tarefa de casa, cerca de 30 exercícios quase idênticos, só mudando os números. Tudo muito mecânico.
Sim, tive alguns mestres diferenciados, que nos faziam debater temas controversos sem nos dar respostas pré-formatadas. Mas, foram poucos e, mesmo estes, dada a reduzida carga horária diária (4 horas de aula), em que se espremiam conteúdos de 11 matérias, pouco podiam fazer para nos ensinar a pensar – pensar historicamente, matematicamente e, sobretudo, cientificamente. Menos ainda, integrando diferentes disciplinas, a pensar sistemicamente.
No Ensino Médio, passei a ter também de Educação Moral e Cívica, matéria que consistia, à época, em memorizar mantras transcritos no livro didático. Em suma, não tive, inclusive dadas as características da época em que cursei o então chamado colegial, a possibilidade de desenvolver habilidades necessárias para o exercício da cidadania.
Muitos olham para o período em que tive acesso à escola, como uma fase em que havia muito mais qualidade no ensino. Sim, éramos, os poucos que estávamos matriculados nas escolas, privilegiados, inclusive, quanto à frequência de outros equipamentos culturais e a bens como livros, revistas e jornais. Mas, não éramos ensinados a pensar autonomamente.
O tempo passou e, hoje, falamos de outra instituição escolar, onde a escolaridade obrigatória vai dos 4 aos 17 anos e há uma quase universalização do acesso e um avanço importante na taxa de conclusão.
Uma escola que vai formar jovens para tempos em que a Inteligência Artificial vai competir com humanos por postos de trabalho e nos demandar habilidades muito mais sofisticadas.
Com isso, a formação que minha geração recebeu não será suficiente. Precisaremos de adultos aptos a resolver problemas complexos colaborativamente e com criatividade, o que os “robôs” ainda não sabem fazer. Mas para tanto, a Educação Básica precisará ensinar os estudantes a pensarem, a fazerem análises mais aprofundadas, não a decorar respostas prontas que os professores de forma “mastigada”.
Chegaremos lá se investirmos em tornar a profissão de professor mais atrativa, se formarmos os docentes para sua prática, ampliarmos a jornada escolar, incluindo mais atividades de interação e metodologias ativas e não apostarmos em soluções simplistas ou em “balas de prata”.

Educadora e especialista em políticas públicas com uma carreira de destaque no Brasil e no exterior. Foi secretária de Educação do Rio de Janeiro, secretária de Cultura de São Paulo, ministra da administração e reforma e diretora sênior de Educação Global no Banco Mundial. Foi professora visitante nas faculdades de educação das universidades de Harvard e Stanford. Fundou o Centro de Políticas Educacionais da FGV e o Instituto Salto -pensado para dar escala às melhores práticas na Educação, Costin vem explorando há anos o impacto da tecnologia, incluindo a inteligência artificial, na educação. Seu trabalho une visões locais e globais, tornando-a uma voz essencial nos debates educacionais contemporâneos.
