Por outro lado, o número de escolas municipais, estaduais ou federais entre as 500
melhores do país recuou levemente na comparação com 2023
Por Bruno Alfano e Luis Felipe Azevedo — Rio de Janeiro
12/07/2025 03h30 · Atualizado há um dia
O desempenho médio de alunos do ensino público no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) atingiu, no ano passado, o maior patamar desde2018, o mais longe até onde é possível recuar na série histórica. Os resultados mais recentes mostram a menor distância no período entre a nota média dos estudantes das redes pública e privada. Por outro lado, o número de escolas municipais, estaduais ou federais entre as 500 melhores do país recuou levemente na comparação com 2023.
Os dados disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) foram reunidos em relatório elaborado pela plataforma SAS Educação exclusivamente para o GLOBO. A análise indica que o desempenho médio dos alunos do ensino público subiu de 511 para 514 pontos entre 2023 e 2024, um crescimento de 0,63%. O índice é 34 pontos superior ao patamar de 480 registrado há sete anos. Já a rede privada computou uma pequena variação negativa anual, de 0,25% — de 607 pontos, valor recorde na série, para 605.
— As notas vêm aumentando consideravelmente porque existe uma mobilização de muitas redes públicas do país, de projetos inclusive usando inteligência artificial, como em São Paulo e Espírito Santo.
Também temos estados que passaram a disponibilizar plataformas gratuitas em que os alunos praticam com feedback baseado nas cinco competências — afirma Ademar Celedônio, diretor de Ensino e Inovações do SAS Educação.
Especialistas frisam, porém, que o Enem não é a ferramenta mais adequada para aferir o avanço do ensino no país. — A avaliação da rede pública e da privada ocorre por meio do Sistema de
Avaliação da Educação Básica (Saeb). O Enem não é o melhor instrumento para isso — destaca Ernesto Martins, diretor-fundador do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede), que
pede “cautela” na análise dos dados.
Celedônio menciona, por exemplo, a dificuldade dos alunos brasileiros com a Matemática, ainda que, tradicionalmente, dois terços das questões do Enem envolvam conteúdos ensinados até o 9º ano do ensino fundamental. O desempenho médio dos estudantes tanto da rede privada quanto da pública recuou nesta competência em 2024, tal qual nas áreas de Ciências Humanas e Ciências da Natureza.
— Os alunos da rede pública erram com frequência até as habilidades mais simples na prova do Enem. É preciso fazer com que o investimento estatal brasileiro na educação seja mais bem cuidado — cobra o
pesquisador.
Barreira maior
Em contrapartida, houve avanço nas médias de Redação e de Linguagens e Códigos. As flutuações, porém, podem ser mais reflexo da elaboração das questões a cada ano do que de uma mudança no aprendizado dos alunos em si. — A prova veio com mais questões de Sociologia e Filosofia do que o
normal. No campo das Ciências Humanas, foram utilizados muitos autores clássicos, como Hannah Arendt e Foucault, o que aumenta a barreira de entrada dos alunos com menor letramento acadêmico —
avalia Celedônio.
Além do aumento na nota média, também houve um salto na participação de alunos da rede pública no Enem do ano passado: foram pouco mais de 867 mil, uma alta de 84% diante dos 470 mil que
participaram do exame anterior.
O número, entretanto, continua distante do 1,17 milhão de estudantes de instituições públicas alcançado em 2018. Já o total de 16.256 escolas municipais, estaduais ou federais com pelo menos dez representantes no Enem atingiu o maior patamar da série em 2024, crescendo 35% ante as 12.082 de 2023. — Os alunos de 2023 que se inscreveram fizeram isso por estarem muito motivados. Naquele ano, o governo Lula estava envolvido na reforma do ensino médio. O MEC (Ministério da Educação) tinha múltiplos objetivos no campo e, por estar no começo da gestão, houve maior dificuldade de
priorizar o exame. Já no ano passado vimos um trabalho por maior engajamento nas escolas, e a expectativa é que 2025 seja ainda melhor — prevê Ademar Celedônio.
O pesquisador vê o Pé-de-Meia como um dos motivadores para a maior participação de egressos da rede pública. O programa do MEC, que tem como objetivo incentivar os jovens a terminarem o ensino médio e se tornou uma das principais marcas do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), prevê o pagamento de R$ 200 para os beneficiários que comparecerem à prova, além de outros repasses mensais.
— Houve ainda um trabalho importante dos estados com campanhas para que os alunos fizessem o Enem, além da gratuidade do transporte nos dois dias de prova em algumas cidades. E existiu também uma tentativa de esclarecer aos jovens que, por serem da rede pública, estariam concorrendo no sistema de cotas — enumera o diretor de Ensino e Inovações do SAS Educação.
O avanço anual na participação das escolas privadas foi mais modesto, de 12%: de 5.772 para 6.462. Já o número de alunos da rede particular subiu 18%, indo de 198.096 a 233.727 entre 2023 e 2024.
Entre as 500 escolas com melhor desempenho em 2024, a presença de instituições da rede pública está limitada a 21 centros de estudo, o equivalente a 4% do total. O total é inferior ao registrado em 2023,
quando 24 escolas estavam na lista, alcançando 5% do montante. O SAS Educação entende que o resultado é um sinal de “alerta” para os governos e reforça a necessidade de melhoria na qualidade do ensino público.
“Embora a variação percentual pareça discreta, ela reforça uma tendência já conhecida: o domínio quase absoluto das escolas privadas no grupo de maior desempenho, mantendo a rede pública com baixa
representatividade entre as melhores”, destaca o relatório.
Extraído integralmente do O Globo
